terça-feira, 30 de junho de 2009

A Busca do Divino no Homem Ocidental ! Parte 5

O habitante de um espaço vazio !
Para o homem religioso , o espaço não é homogéneo : há um espaço sagrado e há outros espaços não sagrados , sem estrutura nem consistência . Esta não-homogeneidade espacial traduz-se por uma oposição entre o espaço sagrado-o único que é real , o que existe realmente-e tudo o resto , a extensão informe que o envolve .
Quando o sagrado se manifesta por uma qualquer hierofania , não só há ruptura na homogeneidade do espaço , como revelação de uma realidade absoluta que se opõe à não realidade da imensa extensão envolvente . A manifestação do sagrado funda ontologicamente o mundo . Esta descoberta do espaço sagrado tem , pois , um valor existencial para o homem religioso , porque nada pode começar , nada se pode fazer , sem uma orientação prévia - e toda a orientação implica a aquisição de um ponto fixo e central - o axis mundi . Para viver no mundo é preciso fundá-lo - e nenhum mundo pode nascer no caos da homogeneidade e da relatividade do espaço profano .
Esta experiência religiosa da não-homogeneidade do espaço constitui uma experiência primordial , homologável a uma fundação do mundo . E a ruptura operada no espaço que permite a constituição do mundo , porque é ela que descobre o " ponto fixo " , o eixo central de toda a orientação futura .
Ao habitar , pois , um território , o homem está a consagrá-lo e a repetir a cosmogonia original . O " centro " equivale à criação do mundo , e aí onde o sagrado se manifesta surge uma abertura , uma porta comunicante entre as três " zonas cósmicas " : o céu , a terra e o " submundo " dos infernos . O homem primitivo vive , pois , aí onde há uma " abertura " para o sagrado .
A ruptura mais significativa nas sociedades primitivas situa-se ao nível da fronteira entre o espaço da comunidade ( o cosmos ) , por um lado , e o mundo informe e indefinido dos outros ( o caos ) .
Instalar-se num território implica sempre uma decisão vital , quer para o indivíduo , quer para a comunidade . O homem assume com a reiteração da Cosmogonia a criação do " mundo " que escolheu habitar , e a responsabilidade de o manter e de o renovar : a habitação é santificada porque constitui uma imago mundi e o mundo é uma criação divina . Habitar uma moradia é uma decisão religiosa .
A concepção estética renascentista , em ruptura para com as concepções místicas ( é de referir , a este propósito , a Civitale Dei de Santo Agostinho ) , é distintiva de uma pluralidade de espaços funcionais . A concepção funcional integrou-se no paradigma dominante da organização do espaço habitado moderno , ao mesmo tempo abstracto ( geométrico ) e empírico ( funcional ) .
A revolução Industrial respeitou esta herança moderna do funcionalismo , redefinido a partir da visão eufórica da Luzes dos ideais de progresso de uma razão ilumista . Radicalizou o funcionalismo , aliás , rompendo com a polifuncionalidade que impedia a especialização racional dos espaços - o que viria a dar lugar aos projectos de desconcentração e segmentação do tecido social .
Esta forma funcional e progressista de urbanismo insere-se no quadro da explosão urbana que acompanha o desabrochar da industrialização com o consequente êxodo rural . O crescimento demográfico urbano acelerou a necessidade de planificação racional das novas cidades . A população urbana da Europa passou , entre 1850 e 1970 , de cerca de 20 milhões de habitantes para mais de 250 milhões . Era uma população recentemente emigrada do campo , habituada por isso a uma concepção global e integrada da vida coletiva , contando com os laços que prendem o indivíduo ao grupo , em que todos se conheciam em função de uma história comum e o controle social era exercido à ordem à conservação da produção de uma cultura própria , em que a segurança social perante os reveses da natureza era , por conseguinte , assegurada em virtude de formas de solidariedade concreta e direta .
Os recém-chegados às novas cidades e aos novos subúrbios das antigas urbes , confrontados agora com espaços onde a história coletiva se havia processado sem eles , perdem os pontos de referência que até então tinham garantido o reconhecimento recíproco e assegurado as condições indispensáveis ao desenvolvimento de formas concretas de solidariedade . Ficam assim votados à irrupção de comportamentos anómicos de resposta das disfunções sociais e são atirados para espaços marginais em relação aos centros de decisão e de normalidade . A anomia , conceito cunhado pelo sociólogo Durkheim , refere-se precisamente ao desaparecimento das redes de sociabilidade tradicional e à sua substituição , pelo anonimato , pela alienação , pela marginalização e por uma solidão demasiado insuportável que , como uma orquestra ensurdecedora , conduziram a inúmeros e desesperados atos de suicídio .
O ideal funcionalista atingiu o seu máximo entre as duas grandes guerras , como o arquiteto Le Corbusier apresentado ao Congresso de Urbanismo de Atenas uma proposta dominada pela ideia de zoning - " a cada função e a cada indivíduo o seu justo lugar " . O resultado foi amplamente negativo : monotonia , degradação , fealdade , gigantismo , distância cada vez maiores entre locais de habitação , de trabalho e de serviços , insuficiência dos indispensáveis meios de transporte , solidão e aborrecimento sobretudo nas pessoas idosas , insegurança dos espaços intersticiais cada vez mais voltados à circulação de uma população anónima , criminalização , esvaziamento e terceirização dos centros urbanos .



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