terça-feira, 30 de junho de 2009

A Busca do Divino no Homem Ocidental ! Parte 8

A iniciação está tão estreitamente ligada ao modo de ser da existência humana que um número considerável de gestos e de ações do homem moderno ainda repetem os quadros iniciáticos . A " luta pela vida " , as " provas " e as " dificuldades " que entravam uma vocação ou uma carreira repetem de algum modo as práticas iniciáticas : é em consequência do " sofrimento " que um jovem se experimenta a si próprio , conhece as suas possibilidades , toma consciência da sua força e acaba por tornar-se ele próprio espiritualmente adulto e criador .
O homem profano é o descendente desse homo religiosus e não pode anular os comportamentos dos seus antepassados ; além disso , uma grande parte da sua existência é alienada por pulsões que lhe chegam do mais profundo do seu ser , desta zona que se chamou o inconsciente .
Como Carl Gustav Jung concluiu , os conteúdos e as estruturas do inconsciente apresentam similitudes surpreendentes com as imagens e as figuras mitológicas . Os conteúdos e as estruturas do inconsciente são o resultado das situações existenciais imemoriais , sobretudo das situações críticas , e é por essa razão que o inconsciente apresenta uma aura religiosa . Toda a crise existencial põe de novo em questão ao mesmo tempo a realidade do mundo e a presença do homem no mundo : isto quer dizer que a crise existencial é , em suma , religiosa , visto que , aos níveis arcaicos de culturas , o ser confunde-se com o sagrado .
A religião é a solução exemplar de toda a crise existencial , porque é a experiência do sagrado que funda o mundo . Solução exemplar , não somente porque é indefinidamente repetível , mas também porque é considerada de origem transcendental e , por consequência , valorizada como uma revelação recebida de um outro mundo , trans-mundo . A solução religiosa não somente resolve a crise , mas ao mesmo tempo torna a existência " aberta " a valores que já não são contingentes nem particulares , permitindo assim ao homem ultrapassar as situações pessoais e , no fim de contas , o acesso ao mundo do espírito .
Até o homem mais profundamente a-religioso partilha ainda , no mais profundo do seu ser , de um comportamento religiosamente orientado . Mas as " mitologias " privadas do homem moderno-os seus sonhos , os seus devaneios , os seus fantasmas , etc . - não conseguem alçar-se ao regime ontológico dos mitos , justamente porque não são vividos pelo homem total e , por consequência , não transformam uma situação particular em situação exemplar . Do mesmo modo como as angústias do homem moderno , as suas experiências oníricas ou imaginárias , bem que " religiosas " do ponto de vista formal , não se integram , como entre o homem religioso , numa concepção do mundo e não fundam um comportamento .
A atividade inconsciente do homem moderno não cessa de lhe apresentar inúmeros símbolos , e cada um tem certa mensagem a transmitir , uma certa missão a desempenhar , tendo em vista assegurar o equilíbrio da psique ou restabelecê-lo . O símbolo não somente torna o mundo " aberto " , mas ajuda também o homem religioso a acender ao universal . Porque é graças aos símbolos que o homem sai da sua situação particular e se " abre " para o geral e para o universal . Os símbolos despertam a experiência individual e transmundam-na em ato espiritual , em compreensão metafísica do mundo . Compreendendo o símbolo , o homem das sociedades pré-modernas consegue viver o universal .
O homem a-religioso das sociedades modernas é ainda alimentado e ajudado pela atividade do seu inconsciente , sem que por isso aceda a uma experiência e a uma visão do mundo propriamente religioso . O inconsciente oferece-lhe soluções para as dificuldades da sua própria existência , e neste sentido desempenha o papel da religião , porque , antes de se tornar uma existência criadora de valores , a religião assegura-lhe a integridade . De um certo ponto de vista , quase poderia dizer-se que , entre aqueles modernos que se proclamam não-religiosos , a religião e a mitologia estão " ocultas " nas trevas do seu inconsciente - o que quer dizer também que as possibilidades de reintegrar uma experiência religiosa da vida jazem , em tais seres , muito profundamente neles próprios .
Por isso , e em resposta à pergunta " Será o homem moderno realmente não-religioso ? " , este texto avança com uma hipótese de resposta : " não ! " . De uma concepção sagrada da experiência a um racionalismo exacerbado , com todas as consequências que daí advieram , encontramo-nos agora num ponto de viragem , num momento crítico da existência humana . E isto , porque o sentimento religioso é uma realidade universal , intemporal e comum a todos os homens sem excepção - por muito " desconectados " que estejam dessa sua dimensão interior .

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