domingo, 2 de novembro de 2014

" A DOMA DO TOURO "

Os Dez Quadros de Iluminação Através do Zen

8- Diversos Expedientes 

Outros meios propostos são os seguintes :
a) Cânticos dos dharani , de Kirtan ou entoação de mantras ( uma série de palavras ou nomes mais ou menos sem significado preciso , aos quais se atribuem poderes mágicos capazes de ajudar quem os repete em momentos de angústia ) .
Se bem que as inevitáveis alterações dos sons originais retirem um pouco de tal efeito , as transliterações fonéticas de palavras sânscritas ainda são consideradas eficazes quando a recitação é feita com sinceridade e convicção .   Há mesmo uma espécie de transferência das virtudes que sendo apanágio dos seres excelsos ( Boddhisatva ) são invocadas durante a entoação .
Constituem um excelente exercício para treinar a mente e superar as formas dualísticas do pensamento ordinário , pois os dharani simbolicamente expressam , em som e ritmo peculiares , a verdade essencial do Universo , verdade essa que transcende o intelecto discriminador .
A recitação repetida dos sutras ( palavras , aforismas , sermões provindos do próprio Buddha ) destina-se a reforçar a crença nos ensinamentos neles contidos . Decresce a necessidade de cantá-los à medida que a fé se torna profunda e atuante .
Além dos sutras há o vazio por eles apontado , o senso de realidade que pode ser captado , quando a mente penetra no silêncio , no momento previsto sempre como o final adequado para a tripla entoação . Aí vigora novamente o mesmo fenômeno registrado no espaço vazio dos Quadros , se é o desenho despojado que permite à mente conscientizar-se plenamente do significado do espaço em branco e com ele identificar-se , é o silêncio que aponta para o sentido real dos sutras , sempre velado pelas palavras simbólicas .
O objetivo não se altera seja qual for o expediente empregado para provocar tal estado de consciência e suscitar um conjunto de circunstâncias para torná-lo permanente e atuante em quase todos os momentos da vida diária e rotineira . Ele é definido e simplíssimo em aparência e em realidade ; todo o esforço a ser dispendido , toda a constância e persistência exigidas não são mais que um retorno , uma desvelação , um redescobrir do que sempre foi , é e será eternamente a essência , a Verdade do ser humano .
Tratando-se especificamente do Touro , ele jamais fora perdido , jamais se afastara um só instante de seu pastor , jamais se ausentara de seu lar natural . A condição humana , presa ao mundo fenomênico , onde impera a ilusão cósmica da separatividade ( Maya ) , inerente e inseparável da Manifestação Universal , é que impede a integração da pessoa humana naquele derradeiro-inicial e único estado de consciência .


9- A Iluminação  

No momento em que cessa a heresia ilusória da separatividade , da individualização , Touro e pastor , Mente Búdica e personalidade existencial identificam-se , sobrevindo a " Iluminação " e consequente paz , equilíbrio , harmonia e reconstrução kármica .
É o renascimento na carne atual , o fazer-se criança receptiva ao movimento cósmico , enfrentando sem medo transmutação incessante , necessária ao processo de evolução da Vida em todas as suas formas e manifestações .
Terremoto , revolução , implosão , salto abissal , cataclisma , introjecção constituem algumas das designações empregadas na vã tentativa de expressar o inexprimível . Todo o longo e fastidioso preparo anterior , a perseguição e o negacear fugitivo e escorregadio do Touro , o duelo existencial em que a personalidade individualista tende a desistir do embate , deixando assim a Mente Búdica permanecer oculta , em estado latente , pouco manifesta , findam de forma brusca , instantânea , inesperada a irreversível .
Tal surgimento explosivo obscurece de tal modo a fase preparatória , que muitos renegam suas próprias experiências básicas , afirmando não existir graus de realização , enfatizando apenas o eclodir da Luz . Isso contradiz fundamentalmente o processo do desabrochar de toda e qualquer plenitude : a semente resulta do fruto provindo da flor , cujo desabrochar pressupõe o botão originário de uma semente igual à que atualmente contém em si todo o processo da Vida .
Houve , é certo , um longo período de amadurecimento , uma gestação fecundada natural e espontaneamente , uma passagem gradativa para estados cada vez mais refinados de consciência 
Realizada através de árduos exercícios , de direcionamento magistral , de quedas e levantadas ( cai sete , levanta oito ) de desistências e retomadas , de esperanças e frustrações sem conta , tal experiência ( se assim pode ser chamada ) se apresenta no climax tão normalmente natural , tão simplesmente comum , tão explosivamente calma e tranquila , que nada há a registrar , nada a transmitir , nada a vivenciar , nada a prolongar .
É -se assim se pode tentar comparar o incomparável - uma espécie de " retorno à Morada com as mãos vazias " , nas sábias e milenares palavras de Mestre Dogen ( 1.200 a 1.253 ) Nada se traz que antes já não se possuía , nada se acrescenta , nada se perde , nada se ganha , nada se tem . Mas a alegria , a felicidade , a serena autoconfirmação , essas são perenes e irrebatáveis .
" Tudo é irradiação , pura irradiação . Posso agora progredir para sempre , rumo à perfeição em harmonia natural com minha vida cotidiana " .
Assim pôde afirmar , no século XX , Yaeko , a jovem japonesa discípula do sábio Harada-roshi ( Os Três Pilares do Zen - Philip Kapleau ) .
O exemplo de Yaeko Iwasaki é de uma eloquência tão singela , que nos comove intensamente e nos induz a buscar , em seu exemplo , o fundamento de nossa própria realização espiritual .
É importante , porém , salientar que esse estado natural , somente se manifesta depois de um mergulhar nas fontes da Sabedoria Eterna até a identidade completa .
Para os ocidentais é bastante difícil reconhecer que a Sabedoria Oriental oferece maiores possibilidades de compreensão , em profundidade do que seja o homem , a vida e sentir Deus ou Absoluto em si e em todo o Universo .
Os ensinamentos que nos foram legados , apresentam um maior grau de distorção em relação a suas origens do que os provindos das correntes e doutrinas do Oriente , entre as quais a beleza , a harmonia e a coerência predominam . Tal diferença talvez possa ser atribuída aos " intermediários " que não se vexaram de retocar as mensagens evangélicas primitivas , levados pelo radicalismo , obediência aos dogmas posteriores , ou pelo afã fanático de ressaltar a primazia de seus ideais místicos .
Tal fato , se ocorreu no Oriente , não provocou as contradições aparentes encontradas nos textos cristãos . Nos livros básicos da mística oriental não há desajustes doutrinários nem desejo de supremacia ou exclusivismo . O que nos chegou do trabalho milenar dos diferentes compiladores são obras clássicas , coincidentes e coerentes entre si , ainda que crenças , doutrinas , conceitos e valores denotem diferenças superficiais . Não há jamais conflito entre elas , somente diversidade na forma de apresentar as ideias dentro da unidade fundamental do pensamento místico-religioso .
Em todos os sistemas religioso do Oriente , observa-se uma constante : o realce supremo da procura da Luz Interior , cujo encontro é sempre obra única do próprio aspirante . Mestres , guias , literatura religiosa constituem apenas " o dedo a apontar para a Lua " , não o satélite , símbolo usual da Iluminação , a brilhar na escuridão noturna da ignorância .
A imanência divina é o ponto crucial , o fundamento imprescindível , sendo o Transcendente tão indiscutivelmente óbvio , que preocupa-se em defini-lo ou compreendê-lo é malbaratar tempo , esforço e elocubrações em algo que ultrapassa todos os campos do intelecto , da ciência , da vã filosofia humana .
Como as religiões cristãs colocam toda a ênfase na salvação vicarial , o adepto de tais doutrinas não é induzido a levar em consideração a Imanência do Cristo , mas a fazer do " só chegar ao Pai por mim " o fundamento de sua fé . Apesar de intitular-se sempre " irmão em Cristo " , delega sempre unicamente a Jesus todo o sentido universal da divindade humana .
O senso agudo da auto-responsabilidade de fazer resplandecer , em si mesmo e em todos os atos , palavras e pensamentos cotidianos , a Luz existente no próprio interior humano , é a tônica dos ensinos orientais sem nenhuma ressonância entre nós .
A harmonia , a perfeição , a coerência percebidas no taoismo , budismo ,tantrismo , zenbudismo , provém da ênfase colocada nesse aspecto original e inusitado : considerar o homem como um ser responsável por sua auto-evolução espiritual a ser conquistada pelo próprio e estrênuo esforço , devotamento , perseverança , constância e fé em sua destinação cósmica .
A proteção e guia dos Mestres é apenas um acessório utilíssimo , um dos " meios " de conexão com o Infinito . Todos os inumeráveis meios tendem a reduzir-se ou extinguir-se quando o discípulo atinge o ponto de maturação em que se transforma no autor de sua própria iniciação .
Os Dez Quadros fazem parte desses expedientes preliminares , pois contemplá-los , estudá-los com atenção , integrar-se no seu conteúdo é propiciar o fluir do processo natural , que só vai acontecer na maioria dos casos individualizados de Iluminação .
Conhecendo a dificuldade encontrada , em nosso meio sócio-cultural , para obter material didático adequado aos enfoques orientais sobre o dilema do homem , propusemo-nos a tecer comentários sobre esse tema , cuja ideia original remonta a milênios , animando-nos a fazer uma transposição do mesmo para uso local .
" As ideias são de quem as possui em profundidade " . Se não conseguem ser originais é porque " Nihil novi sub sole " . Julgamos preferível bordar sobre assunto de domínio universal a tentar criar banalidades , cujo único mérito seria a discutível e inédita criatividade . Se também as ideias não tiverem sido assimiladas por nós na profundidade necessária a uma transmissão proveitosa , muito o lastimaríamos , pois isso significaria o fracasso de nosso objetivo .
Se pudermos levar algum aluno-leitor a interessar-se pelo real significado transcendente ds Dez Quadros a ponto de desejar conhecê-los melhor , vivenciar intelectualmente seu conteúdo e , talvez experienciar Aqui e Agora o fulgor da própria Iluminação , alcançaríamos o máximo a que podemos esperar em tal caso .


10- Sentido da Iluminação   

Desde a mais remota Antiguidade , a palavra Luz parece ser o vocábulo mais expressivo para definir o supremo estado de consciência humana .
A antinomia Luz-Treva , Dia-Noite , Sabedoria-Ignorância está presente em todos os ensinamentos que tendem a religar o ser humano ao Transcendente , quer os mesmos pertençam ao final do século XX , quer façam parte dos mistérios esotéricos oriundos dos mais recuados tempos da História da Civilização .
Tudo o que sobrevive às mudanças , pertence ao acervo cultural de toda a raça , não sofre solução de continuidade , obviamente é algo inerente à espécie humana , uma herança arquétipa da qual o homem jamais poderá prescindir ou desfazer-se .
Mesmo no campo fisiológico , a plenitude do uso da razão , do discernimento , de todas as funções atribuídas ao cérebro ou à mente é chamada de " lucidez " , termo cognato de luz , de iluminação .
Considerando-se que a palavra Deus deriva da raiz sânscrita " div " , cujo significado é Luz , compreende-se que tentar penetrar nos arcanos religiosos é lidar continua e ininterruptamente com o nome Iluminação .
Todos os conceitos a ela ligados , provindos de egípcios , hindus , assírios , babilônios , persas , judeus , tântricos , cristãos , sufis , islamitas , mantém sempre a oposição Luz e ignorância , essa simbolizada pela treva , o estado do homem alienado de sua predestinação cósmica . Falamos em " conceitos " , mas tal não é nosso verdadeiro objetivo . Ao que visamos , é ultrapassar todo e qualquer conceito , mesmo aquele portador de uma conotação sublime .
Iluminar-se é impregnar-se totalmente do significado intrínseco , imanente da Luz . É nela imergir da forma tão profunda e integral , que não reste mais nenhuma brecha , nenhum resquício de separatividade , nenhum movimento mental a proclamar a identificação , ela mesma .
A menos que a Luz se torne o leit motif , a base e a estrutura da própria Vida , o homem não será completo , não terá atingido sua perfeita e verdadeira condição divina .
O florescer consciente na Luz implica um enraizamento anterior na ignorância . Só está em condições de " conhecer-se a si mesmo " quem saiba o que é treva , essa ignorância sem começo porque é o próprio cerne da Existência Cósmica . Seu fim , entretanto , depende exclusivamente da " percepção da Verdade Inata " .
Por que vamos repetir que a ignorância não teve início ?
Ela é o " estado falsamente natural " do homem , que nela vive mergulhado desde seu primeiro surgimento em forma corporal e continua ainda apesar de já haver vivenciado inúmeras existências terrenas . Libertar-se da treva é sua tarefa primordial , sua participação no Plano Divino concernente à raça e ao Planeta .
Labor aparentemente fácil e possível de ser realizado por todos , porém tão ignorado , tão diminuído em face das contingências materiais , tão insignificativo para a imensa e esmagadora maioria , que parece sempre uma temeridade bater sobre essa tecla .
" Através da experiência , a criatura transcende " , ensina Bhagwan Shee Rajneesh , buscando mostrar que somente os seres capazes de aceitar a Vida total , com seus erros e maldades , seus desvios e recaídas , seus vícios e misérias para deles extrair a pureza e a inocência virginal como uma transcendência do ser, jamais como uma imposição sócio-religiosa , ou um bloqueio , uma supressão antinatural pronta a explodir tal uma caldeira inaptamente graduada , atingem a Luz .
Não há , diz o Mestre hindu , nenhuma beleza em ver a Luz quando é dia . " Há beleza também , se , na mais trevosa das noites , teus olhos , já treinados para a escuridão , conseguem ver o dia ali oculto " .
" Se tu mesmo , afirma o Tantra , aceitando teus desejos até que , com a aceitação , sobrevenha a ausência de desejos " .
Completando esse aforisma tântrico , o sábio acrescenta : " E quando se súbito , chega um momento em que , aceitos totalmente , os desejos naturalmente se vão , há uma inesperada e inevitável Iluminação . De súbito , sem que nada tenhas programado , acontece " a maior dádiva que esta existência pode oferecer " .
Não se trata de um ajustamento aos padrões sociais , mas de uma total transformação , um estar pronto e apto para a harmonia com o Cosmos .
Somente quando a Luz interna começa a arder , o Iluminado pode iniciar seu trabalho junto aos outros homens , pois seu auxílio flui espontânea e oportunamente . Torna-se então " como uma flor desabrochada , dela o vento colhe a delicada fragrância para espalhá-la suavemente sobre a Terra " . Verdade Inata , a Luz não necessita ser buscada , trabalhada , criada , acesa , revelada , desenvolvida . É algo que o homem já possui dentro de si mesmo em sua total plenitude de fulgor , beleza e perfeição .
Ninguém se transmuta em Luz ; ela estava continuamente a brilhar no âmago do ser , oculta pelos véus da ignorância , pela ânsia de vida material , de ação , de glória , de permanência no conhecido .
O fundamental é a afirmação de que " já sou perfeito " . A Iluminação está ao alcance de todos . Aqui e Agora , não demandando tempo de espera , nem exercícios , nem sacrifícios , nem oferendas ou pagamentos Kármicos de qualquer espécie , nem afã ou interesse demasiados ou ansiedade , produtores de perturbações emocionais e permanência nas trevas .
É uma receita tão simples e fácil , que sua prática , sua aceitação plena , sua experiência integral repugnam a maior parte dos viventes . Preferem os ensinamentos clássicos , tradicionais , herança de um passado eivado de temor , de dogma , de ritos complicados e absurdos , de ideia de pecado e reparação distanciada no tempo e no espaço , da salvação vicarial , o fluir de um processo lento de semeadura e colheita , de transformação progressiva , com todas as prováveis reincidências ao oferecimento de uma eclosão súbita , de um despertar repentino para uma situação pré-existente desde sempre .
" A Luz está em ti , deixa-A brilhar " murmuravam os hierofantes egípcios aos ouvidos dos preparados para a recepção do esotérico ; do defenso aos satisfeitos com sua própria escuridão .
Os quadros do Touro objetivam sobretudo tornar viável este momento de implosão luminosa . A afanosa busca , a luta , o apascentar são o prelúdio a anunciar o instante imprevisto e repentino em que a Luz dissipa a treva , a Verdade , face a face com a ignorância , fá-la findar sua aparentemente interminável identidade com o ser humano .
Apesar do característico e essencial aspecto súbito do ato iluminatório , a retirada do véu da ignorância só pode ser concebida como um processo a fluir através do tempo . Esse termo apresenta aqui uma conotação extensíssima , uma abrangência de todos os eons , que compõe uma respiração cósmica , um dia de Brahma , o período compreendido entre uma determinada exalação vital do Universo e sua posterior inalação na Fonte Primordial donde haviam sido emanados .  
Relatam as escrituras secretas que um ser humano realmente integrado na Plena Luz do Vazio , um genuíno e total liberado da dualidade existencial tem o poder de realizar sozinho tal cometimento sem esperar que toda a Vida Manifestada em um Manvantara seja reabsorvida em seu Princípio Cósmico . Parece , no entanto tratar-se de casos extremos . Quando tal possibilidade é aventada , segue-se sempre um aviso sobre a inter-relação inseparável de Prajna e Karuna ( Sabedoria e Compaixão ) .
A Compaixão pelo estado de ignorância dos demais seres viventes , obstáculo a ser superado para que haja a identidade com a plenitude da Luz Única e indiferenciada , impede que isso aconteça . Retido por Karuna , o liberado em vida permanece como orientador e guia dos caminhantes em atraso , apesar de ter consciência de que não há nem jamais houve caminho , nem caminhante , nem caminhada nem meta alguma a atingir.
A Mente Búdica , nele e em todos os seres universalmente viventes , sempre foi , é e será de luminosa pureza , perfeita , absoluta . O equilíbrio harmônico entre Compaixão e Sabedoria é tão intenso , que não empalidece Prajna , mais a impregna totalmente , tornando uma impossibilidade cósmica uma saída individual da Roda de transmutações e também do Nirvana , que lhe é inerente .
Assim se percebe que o processo de Iluminação é ilimitado e infinito não só em sentido temporal-espaço-causal , como também em graus de profundidade e extensão .
Sonhar com a Iluminação repentina sem o anterior e básico treinamento é uma utopia somente alimentada pelos ineptos e débeis candidatos a um sucesso sem esforço , tenacidade e concentração . Toda a atividade criadora do Cosmos é um desmentido formal a essa expectativa não prevista por nenhuma doutrina oriental entre as inúmeras , cujo postulado máximo é a experiência da autoconfirmação búdica . Não se deve confundir o clímax de um processo lento e gradual com a inexistência ou não necessidade de um aprendizado , que nele deve ter não um fim absoluto e impossível , mas um deslumbrante , inolvidável , marcante momento de expansão , extraordinariamente revelador de um estado até então desconhecido .
A enorme diferença existente entre a vivência experiencial direta e inconfundível da Iluminação e os anteriores e precursores estados de consciência até então , sentidos pelo agora possuidor da plenitude da Luz é que impele a caracterizar tal instante sublime e , raras vezes repetido , como um abalo sísmico não previsto não programado , não ensaiado Porém , os terremotos podem surpreender os desavisados seres humanos que afrouxaram cada vez mais seus laços com o meio circundante ; aves , peixes e outros animais , bem mais sensíveis que os próprios sismógrafos , sentem e manifestam que a gestação telúrica chegou a seu término , e o fenômeno vai ocorrer com toda a sua terrível e brusca subitaneidade .
" Não há graduações na Iluminação . Desde que chega , aí está . É como saltar para um Oceano de sensações . Tu saltas ; tu te tornas uno com ele , como uma gota que tomba no Oceano , com ele se torna una . Mas isso não quer dizer que conheces todo o Oceano " .
Assim fala Bragwan Shree Rajneesh o guru de Poona . Tal explicação , em sua clareza concisa , vale por um tratado acerca do processo de Iluminação após o ato confirmatório . Elucida sobre a totalidade experienciada no instante justo da extinção do ego , condição sem a qual não existe findar da ignorância .
Aliás , esse sábio Mestre contemporâneo salienta a diferença básica entre os dois pontos da dicotomia existencial : a ignorância não teve começo , mas é passível de término . Por ser a característica básica de separativa dualidade cósmica , a ignorância é decisiva para manter em movimento a própria Manifestação Vital , pois sem Maya , o véu ilusório básico da separatividade entre os diversos e o Uno , não haveria experiência existencial , inerente que ela é do mundo do nome e da forma .
" A Iluminação , ao contrário , tem um princípio , mas jamais finda " . O autor da tão importante afirmação enfatiza ainda ser o ponto perigoso do magno e misterioso evento o instante crucial em que as duas oponentes misturam-se , confundem-se , unificam-se , isto é , " ambas são uma " .
Esse ponto entrelaçado possui então duas faces em oposição simbiótica : uma voltada para a ignorância sem princípio , a outra encarando o começo da infindável Iluminação , ambas unidas num derradeiro e definitivo nô , pois a existência da Luz nascitura marca o extinguir irremediável e fatal da treva . Parece-nos muito importante conhecer a probabilidade desse momento , fugaz e único , em que o faiscar da Iluminação , até aí embrionária , se produz de forma súbita , explosiva , total .
Ser definitiva e interminável é o paradoxal absurdo e o insolúvel mistério da Iluminação , cuja natureza e presença consciente provocam compreensão , paz equilíbrio , harmonia , perfeita sanidade e sintonia com o ambiente , em lugar do desespero e desilusão que seriam de esperar em tal circunstância e em face da condição humana sempre ávida da conclusões , de recompensas eternas , de celestiais fins .
Iluminado em plenitude , o ente humano " sabe " e " Saber " é conscientizar-se do mistério insolúvel e infinito sem nenhuma esperança de decifrá-lo , é admiti-lo como definitivo , é chegar ao extremo limite do intelecto , é atingir a compreensão pela ausência natural de pensamentos , é a identificação da personalidade total com o mistério total pela aceitação plena do mistério da Vida , é mergulhar num abismo sem fundo não através da mente , mas sim da totalidade do ser .
É o início sem fim , é a abertura sem fechamento , é o contínuo AVANTE a apontar para uma participação cada vez mais intima , mais exclusiva , mais existencial , tanto mais atraente e misteriosa quanto mais o ser sabe que , alcançando a Iluminação , jamais a atingirá em plenitude e onipotência .
Atingir um estado luminoso de consciência é estar face a face com um novo estado até então insuspeitado , imprevisto , improvável e jamais conclusivo .



Texto : do livro A Doma do Touro ( RAMANADI )
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