quinta-feira, 10 de maio de 2012

" O PODER DO AGORA "

Eckhart Tolle nasceu na Alemanha , onde viveu até aos treze anos de idade .
Depois de se licenciar pela Universidade de Londres , trabalhou como investigador e supervisor na Universidade de Cambridge .
Aos vinte e nove anos , uma profunda transformação espiritual levou-o a mudar radicalmente a sua maneira de encarar e viver a sua vida . Nos anos que se seguiram , dedicou-se por inteiro a compreender melhor e viver mais profundamente esta transformação , que marcou o início de uma intensa jornada interior . Como testemunho desta experiência , escreveu O Poder do Agora , que rapidamente se tornou um best-seller a nível mundial . O livro que se lhe seguiu , A Prática do Poder do Agora , conheceu também um grande sucesso de vendas .
Eckhart Tolle não está filiado em qualquer religião ou tradição espiritual .
Através do seu ensino , tenta transmitir a mensagem profunda , simples e intemporal que grandes mestres sempre tentaram transmitir : é possível acabar com o sofrimento e alcançar a paz .
Dedica-se agora a viajar e a ensinar por todo o mundo .


VOCÊ NÃO É A SUA MENTE     

O MAIOR OBSTÁCULO À ILUMINAÇÃO 
Iluminação ---- o que é isso ?
Há mais de trinta anos que um pedinte se sentava na berma de uma estrada . Um dia , passou por ali um estranho . " Dá-me uma moedinha ? " pedinchou o pobre , estendendo automaticamente o seu velho boné de basebol .
" Não tenho nada para ter dar " , disse-lhe o estranho . Depois perguntou : " o que é isso em que estás sentado ? " " nada " , respondeu o pedinte . " Apenas uma caixa velha . Sento-me nela desde que me lembro " . " Algum dia viste o que tem dentro ? " Tornou o estranho . " Não " , respondeu o pobre . " De que me serviria ? 
Não há nada lá dentro . " Vê o que tem dentro " , insistiu o estranho . O pedinte conseguiu forçar a tampa . Com surpresa , incredulidade e exaltação , verificou que a caixa estava cheia de ouro .
Eu sou aquele estranho que não tem nada para lhe dar , mas que lhe diz para olhar para dentro . Não para dentro de uma caixa qualquer , como na parábola , mas para dentro de uma coisa ainda mais próxima : para dentro de si próprio .
" Mas eu não sou um pedinte " , dirá você .
Todos aqueles que não encontraram a sua verdadeira riqueza , que é a radiosa alegria do Ser e a paz profunda e inabalável que a acompanha , são pedintes , por maior que seja a fortuna material que possuam . Esses , para terem valor , segurança ou amor , procuram fora de si vislumbres de prazer ou de realização pessoal , enquanto que dentro de si próprios possuem um tesouro que não só inclui todas aquelas coisas , mas é também infinitamente maior do que tudo o que o mundo tem para lhes oferecer .
A palavra iluminação invoca a ideia de uma realização sobre-humana , e o ego gosta de a encarar assim , mas ela não é mais do que o seu estado natural de união sentida com o Ser . É um estado de ligação com alguma coisa incomensurável e indestrutível , com uma coisa que , quase paradoxalmente , constitui a sua essência e , no entanto , é muito maior do que você . Trata-se de encontrar a sua verdadeira natureza , para além de um nome e de uma forma .
A incapacidade de sentir essa ligação dá origem à ilusão da separação , tanto de si próprio como do mundo à sua volta . Você tem então a percepção de si próprio , consciente ou inconscientemente , como um fragmento isolado . Surge o medo , e o conflito interior e exterior torna-se uma norma .
Gosto da definição simples que Buda deu a iluminação : " o fim do sofrimento " . Não há nada de sobre-humano nisto , não é verdade ? É certo que , como definição , é muito incompleta . Apenas lhe diz o que a iluminação não é : não é sofrimento . Mas o que resta quando deixa de haver sofrimento ? Buda mantém silêncio quanto a isso , e o seu silêncio significa que cada um tem de o descobrir sozinho . Ele utiliza uma definição negativa para que a mente a não possa transformar numa crença ou numa realização sobre-humana , numa meta que não possa alcançar . Apesar desta precaução , a maioria dos budistas ainda acredita que a iluminação é para Buda , não para eles , pelo menos na vida presente .
EMPREGOU A PALAVRA SER . 
Pode explicar o que entende por isso ?
O Ser é a Vida Única , eterna e sempre presente para além da diversidade de formas de vida sujeitas ao nascimento e à morte . No entanto , o Ser é ao mesmo tempo transcendente e imanente a cada forma , sendo a sua essência mais profunda , invisível e indestrutível . Significa isto que você lhe tem acesso agora sob a forma do seu Eu mais profundo , da sua verdadeira natureza . Mas não procure agarrá-lo com a sua mente . Não tente compreendê-lo . Só o poderá conhecer quando a sua mente estiver aquietada . Quando estiver presente quando a sua atenção estiver plena e intensamente no Agora , o Ser poderá ser sentido , mas nunca poderá ser compreendido mentalmente . A iluminação é recuperar o conhecimento do Ser e manter-se nesse estado de " sentir-percepção " .
Quando diz Ser , refere-se a Deus ?
Se sim , porque não o diz ?
A palavra Deus foi esvaziada do seu sentido ao longo de milhares de anos de utilização abusiva . Por vezes , eu emprego a palavra , mas faço-o com moderação . Por utilização abusiva , quero significar que há pessoas que sem nunca terem vislumbrado sequer o reino do sagrado , a vastidão infinita por trás dessa , palavra , a usam com grande convicção , como se soubessem do que estão a falar . Ou então , argumentam contra ela , como se soubessem o que estão a negar . Tal utilização abusiva dá origem a crenças absurdas , asserções e ilusões egoicas , do gênero " O meu ou o nosso Deus é o único Deus verdadeiro , e o teu Deus é falso " , ou como a famosa afirmação de Nietzsche " Deus está morto " .
A palavra Deus tornou-se um conceito fechado . No momento em que a palavra é pronunciada , cria-se uma imagem mental , talvez já não a de um velho de barbas brancas , mas ainda assim uma representação mental de alguém ou de alguma coisa exterior a si e , sim , é verdade , quase inevitavelmente alguém ou alguma coisa do sexo masculino .
Nem Deus , nem Ser , nem qualquer outro termo conseguem definir ou explicar a inefável realidade por trás destas palavras , pelo que a única questão importante é saber se a palavra em questão o ajuda ou o impede de ter a experiência d'Aquilo para que ela aponta . Será que ela aponta para além de si própria para essa realidade transcendental , ou presta-se com demasiada facilidade a não ser mais do que uma ideia na sua cabeça , uma crença , um ídolo mental ?
A palavra Ser não explica nada , mas a palavra Deus também não . Ser , no entanto , tem a vantagem de ser um conceito aberto . Não reduz o invisível infinito a uma entidade finita . É impossível formar uma imagem mental da palavra . Ninguém pode reclamar a propriedade exclusiva do Ser . Trata-se da sua própria essência , e você tem-lhe acesso imediato ao sentir a sua própria presença , o entendimento de que o Eu sou é anterior a pensar " eu sou isto " ou " eu sou aquilo " . Por conseguinte , da palavra Ser à experiência de Ser não vai mais do que um pequeno passo .
Qual é o maior obstáculo que se opõe a que tenhamos a experiência dessa realidade ?
A identificação com a sua mente , o que faz co que o pensamento se torne compulsivo . Não ser capaz de parar de pensar é uma aflição terrível , mas nós não o compreendemos porque praticamente toda a gente sofre do mesmo mal , pelo que se considera normal . Esse barulho mental incessante impede que você encontre o reino da quietude interior que é inseparável do Ser . Cria igualmente um falso eu , obra da mente , que lança uma sombra de medo e sofrimento . Mas adiante , veremos tudo isso em pormenor .
O filósofo Descartes acreditava que tinha encontrado a verdade mais fundamental ao fazer a sua famosa afirmação : " Penso , logo existo " . Na verdade , estava a dar expressão ao erro mais básico : equiparar pensar a Ser e identidade a pensamento . O pensador compulsivo , o que significa praticamente toda a gente , vive num estado de aparente separação , num mundo insensatamente complexo de problemas e conflitos contínuos , um mundo que reflete a sempre crescente fragmentação da mente . A iluminação é um estado integral , de se estar " em uníssono " e por conseguinte em paz . Em uníssono com a vida no seu aspecto manifestado , o mundo , assim como com o seu Eu mais profundo e a vida não manifestada - em uníssono com o Ser . A iluminação não é apenas o fim do sofrimento e do perma-nente conflito interior e exterior , é também o fim da temível escravidão ao pensar incessante . Que incrível é esta libertação !
A identificação com a mente cria um filtro opaco de conceitos , rótulos , imagens , palavras , críticas e definições que bloqueiam qualquer relacionamento verdadeiro . Coloca-se entre si e o seu Eu , entre si e seu semelhante , entre si e a Natureza , entre si e Deus . É este filtro de pensamento que cria a ilusão da separação de que existe você e um " outro " totalmente separado . Então você esquece-se do fato essencial de que , por baixo do nível das aparências físicas e das formas separadas , você é uno com tudo o que é . Quando digo que você se esquece , quero dizer que deixa de sentir essa unicidade como uma realidade evidente por si mesma . Poderá acreditar que talvez ela seja verdadeira , mas deixa de saber que ela é verdadeira . Uma crença poderá ser reconfortante . Contudo , é unicamente através da sua própria experiência que ela se torna libertadora .
Pensar tornou-se uma doença . A doença ocorre quando as coisas perdem o equilíbrio . Por exemplo , não há nada de errado na divisão e multiplicação das células do corpo , mas quando esse processo se perpetua à margem da totalidade do organismo , as células proliferam e surge uma doença .
Nota : A mente é um instrumento magnífico se for usada corretamente .
Contudo , se for usada erradamente torna-se muito destrutiva . Falando com mais exatidão , não se trata tanto de você usar a mente erradamente - geralmente não a usa de maneira nenhuma . É ela que o usa a si . É a doença .
Você acredita que é a sua mente . É a ilusão . O instrumento tomou conta de si .
Não estou totalmente de acordo consigo . É certo que a minha mente deambula , por vezes , como acontece com a maioria das pessoas , mas ainda assim posso decidir usar a minha mente para obter e realizar coisas , e faço-o constantemente .
Só porque você consegue resolver um problema de palavras cruzadas ou construir uma bomba atômica não quer dizer que esteja a usar a sua mente . Da mesma maneira que os cães gostam de roer ossos , também a mente gosta de se dedicar aos problemas . É por essa razão que ela resolve problemas de palavras cruzadas e constrói bombas atômicas . Você não se interessa por nenhuma dessas coisas . Deixe-me fazer-lhe uma pergunta : pode libertar-se da sua mente sempre que o deseje ? Já descobriu o botão que a " desliga " ?
Quer dizer , parar de pensar totalmente ? No , não posso , salvo talvez por alguns breves instantes .
Então a mente está a usá-lo a si . Inconscientemente identificado com ela , você nem sequer sabe que é escravo dela . É quase como se estivesse possuído sem o saber , e por isso julga que a entidade possessora é você próprio . O começo da libertação é a compreensão de que você não é a entidade possessora - o pensador . Saber isso permitir-lhe-á observar a entidade . No momento em que começar a observar o pensador , é ativado um nível mais elevado de consciência . Depois começará a compreender que existe um vasto reino de inteligência para além do pensamento , que o pensamento é meramente um pequeno aspecto dessa inteligência . Também compreenderá que todas as coisas que realmente contam - beleza , amor , criatividade , alegria , paz interior - têm origem para além da mente . Começará a despertar .

LIBERTE-SE DA SUA MENTE 

O que quer dizer exatamente por << observar o pensador >>
Se uma pessoa for ao médico e disser << Ouço uma voz dentro da minha cabeça >> , o mais certo é que essa pessoa seja remetida para um psiquiatra . O fato é que , de um modo muito semelhante , praticamente toda a gente ouve constantemente uma voz , ou várias vozes , dentro da cabeça : é o processo do pensamento involuntário que você tem o poder de travar , embora não o saiba .
Monólogos ou diálogos contínuos .
Provavelmente já se cruzou na rua com pessoas " malucas " que falam e resmungam incessantemente consigo próprias . Pois bem , isso não é muito diferente daquilo que você e todas as outras pessoas " normais " fazem , só que não o fazem em voz alta . A voz comenta , especula , crítica , compara , queixa-se , gosta , não gosta , e por aí fora .
A voz não é necessariamente relevante para a situação em que você se encontra no momento ; provavelmente , ela estará a reviver o passado recente ou distante , a ensaiar ou a imaginar possíveis situações futuras . Aqui , ela muitas vezes imagina que as coisas irão correr mal ou terão resultados negativos ; chama-se a isto preocupação . Por vezes , essa pista sonora é acompanhada por imagens visuais ou " filmes mentais " . Mesmo que a voz seja relevante para a situação presente , ela interpretará essa situação em termos de passado . É assim porque a voz pertence à sua mente condicionada , que é o resultado de todo o seu historial passado , assim como do contexto mental e cultural coletivo que você herdou . Portanto , você vê e julga o presente através dos olhos do passado e obtém dele uma visão totalmente distorcida .
Não é raro que a voz seja o pior inimigo de uma pessoa . Muitas pessoas vivem com um carrasco na cabeça que as ataca e castiga constantemente e lhes suga a energia vital . Ela é causadora de uma tremenda angústia e infelicidade , assim como de doenças .
Mas há boas notícias : você pode libertar-se da sua mente . É a única libertação verdadeira . Poderá começar a dar o primeiro passo já neste momento . Comece por ouvir a voz dentro da sua cabeça o maior número de vezes que puder . Preste particular atenção a quaisquer padrões de pensamento repetitivos , esses velhos discos riscados que provavelmente estão a tocar na sua cabeça há muitos anos . É isso que eu quero dizer com " observar o pensador " , que é uma outra maneira de dizer : escute a voz dentro da sua cabeça , esteja lá como testemunha presencial . Ao escutar essa voz , escute-a com imparcialidade . O mesmo é dizer , não julgue . Não critique nem condene o que ouve , porque fazê-lo significa deixar a mesma voz entrar novamente pela porta de trás . Depressa compreenderá : 1 à está voz , e aqui estou eu a ouvi-la , a observá-la . Esta consciência de que eu estou , esta sensação da sua própria presença , não é um pensamento . Tem origem para além da mente .
Por isso , quando escutar um pensamento , esteja ciente não só do pensamento , mas também de si próprio como testemunha do pensamento .
Surge então uma nova dimensão de consciência . E , enquanto ouve o pensamento , sentirá uma presença consciente - a do seu eu mais profundo - por trás do pensamento , subjacente a ele . O pensamento perderá então o poder que tem sobre si e rapidamente abrandará , porque você deixou de estimular a mente através da sua identificação com ela . É o começo do fim do pensar involuntário e compulsivo .
Quando um pensamento abranda , você sente uma descontinuidade no caudal mental - um hiato de ausência de mente . Ao princípio , os hiatos serão curtos , talvez de alguns segundos , mas gradualmente torna-se-ão mais prolongados . Quando esses hiatos ocorrem , você sente uma certa quietude e uma certa paz dentro de si . É o início do seu estado natural de união sentida com o Ser , a qual é geralmente ofuscada pela mente . Com a prática , a sensação de quietude e de paz será mais profunda . De fato , a sua profundidade não tem fim . Sentirá igualmente uma sutil emanação de alegria a surgir bem do fundo de si : a alegria do Ser .
Não é um estado que se pareça com um êxtase . De maneira nenhuma .
Aqui não há perda da consciência . Antes pelo contrário . Se o preço da paz interior fosse uma diminuição da sua consciência e o preço da quietude uma falta de vitalidade e de vivacidade , então não valeria a pena ter essa paz e essa quietude . Nesse estado de ligação interior , você encontra-se muito mais atento , muito mais desperto do que no estado de identificação com a mente .
Está plenamente presente . Esse estado eleva igualmente a frequência vibratória do campo de energia que dá vida ao corpo físico .
À medida que entra mais profundamente nesse reino de ausência de mente , como por vezes se diz no Oriente , atingirá o estado da pura consciência . Nesse estado , sentirá a sua própria presença com tal intensidade e com tal alegria que , por comparação , todo o pensar , todas as emoções , o seu corpo físico , assim como todo o mundo exterior , se tornarão relativamente insignificantes . E apesar disso , não é um estado egoísta , mas antes um estado altruísta .
Transporta-o para além do que anteriormente considerava ser o " seu eu " . Essa presença é a essência de quem você é , mas ao mesmo tempo é inconcebivelmente maior do que você . O que eu estou a tentar transmitir aqui poderá parecer paradoxal ou até mesmo contraditório , mas não existe nenhuma outra maneira de eu me exprimir .
Em vez de " observar o pensador " , também poderá criar um hiato no caudal da mente dirigindo simplesmente o centro da sua atenção para o Agora . Basta que esteja intensamente consciente do momento presente . É uma coisa que se faz com profunda satisfação . Desta maneira , você arrasta a sua consciência para longe da atividade mental e cria um hiato de ausência de mente em que permanece extremamente atento e consciente , mas em que não pensa . É essa a essência da meditação .
Na sua vida diária , poderá praticar isto tornando uma qualquer atividade de rotina , que normalmente não passe de um meio para alcançar um fim , e dando-lhe toda a sua atenção de forma que esta se torne um fim em si . Por exemplo , cada vez que você subir e descer escadas , em casa ou no local de trabalho , preste muita atenção a cada passo , a cada movimento e até mesmo à sua respiração . Esteja totalmente presente . Ou , ao lavar as mãos , preste atenção a todas as percepções sensoriais associadas a essa atividade : o ruído e a sensação da água , o movimento das mãos , o aroma do sabonete , etc . Ou ainda , quando entrar no seu carro , depois de fechar a porta , faça uma pausa de alguns segundos e observe o fluir da sua respiração . Tome consciência da sensação de presença silenciosa , mas poderosa , que daí resulta . Existe um critério certeiro pelo qual poderá avaliar o seu sucesso com este exercício : o grau de paz que sentirá interiormente .
Portanto , o passo mais vital na sua jornada rumo à iluminação é este : aprenda a deixar de se identificar com a mente . Sempre que criar um hiato no caudal da mente , a luz da sua consciência torna-se-á mais forte .
Talvez um dia dê consigo a sorrir perante a voz na sua cabeça , como sorriria perante as traquinices de uma criança . Significa isso que você deixou de levar o conteúdo da sua mente tão a sério , uma vez que a sua sensação de identidade não depende dela .

ILUMINAÇÃO : ELEVAR-SE ACIMA DO PENSAMENTO 

Pensar não é essencial para sobrevivermos neste mundo ?
A sua mente é um instrumento , uma ferramenta . Existe para ser usada numa tarefa específica e , quando essa tarefa termina , põe-se de parte . Assim sendo , eu diria que cerca de 80 a 90 por cento do pensamento da maioria das pessoas é não só repetitivo e inútil , mas , devido à sua natureza disfuncional e muitas vezes negativa , é também muitas vezes prejudicial . Observe a sua mente e verá que isto é verdade . Provoca uma perda considerável de energia vital .
Esta espécie de pensamento compulsivo é , na realidade , um vício . O que é que caracteriza um vício ? Muito simplesmente isto : você deixa de sentir que tem a opção de parar . Parece ser mais forte do que você . E dá-lhe igualmente uma falsa sensação de prazer , prazer esse que invariavelmente se transforma em dor .
Por que motivo seríamos nós viciados em pensar ?
Porque você se identifica com o pensamento , o que significa que obtém a sua sensação de identidade a partir do conteúdo e da atividade da sua mente . Porque você acredita que deixaria de existir se deixasse de pensar . Ao crescer , você forma uma imagem mental da pessoa que é com base nos seus condicionamentos pessoais e culturais . Podemos dar o nome de ego a esse eu fantasma . Consiste na atividade da mente e só pode continuar a funcionar através do pensar constante . O termo ego significa diferentes coisas para diferentes pessoas , mas quando eu o uso aqui significa um falso eu , criado por uma identificação inconsciente com a mente .
Para o ego , o momento presente praticamente não existe . Apenas o passado e o futuro são considerados importantes . Esta total inversão da verdade explica o fato de a mente ser tão disfuncional quando está a funcionar como ego . O ego preocupa-se constantemente em manter vivo o passado , porque , sem ele , quem seria você ? Projeta-se constantemente no futuro para garantir a continuidade da sua sobrevivência e para procurar aí algum tipo de libertação ou de satisfação . Ele diz : " Um dia , quando isto , ou aquilo , acontecer , eu vou sentir-me bem , feliz , em paz . " E mesmo quando o ego parece preocupar-se com o presente , não é o presente que ele vê : distorce-o completamente porque o vê através dos olhos do passado . Ou então reduz o presente a um meio para alcançar um fim , fim esse que fica sempre no futuro que a mente projeta . Observe a sua mente e verá que é assim que funciona .
O momento presente possui a chave para a libertação . Mas você não poderá descobrir o momento presente enquanto você for a sua mente .
Não quero perder a minha capacidade de analisar e discriminar . Não me importaria de aprender a pensar de maneira mais clara , mais concentrada , mas não quero perder a minha mente . A capacidade de pensar é a coisa mais preciosa que possuímos . Sem ela , seríamos apenas uma outra espécie animal .
A predominância da mente não passa de um patamar na evolução da consciência .
Precisamos de chegar ao patamar seguinte agora , urgentemente ; de outro modo , seremos destruídos pela mente , que se terá transformado num monstro .
Falarei disto em pormenor mais adiante . O pensamento e a consciência não são sinônimos . O pensamento não passa de um pequeno aspecto da consciência . O pensamento não pode existir sem a consciência , mas a consciência não precisa do pensamento .
A iluminação significa elevar-se acima do pensamento e não descer a um nível abaixo do pensamento , ao nível de um animal ou de uma planta . No estado de iluminação , você continua a utilizar a sua mente e a pensar sempre que necessário , mas fá-lo-á de uma maneira muito mais concentrada e eficiente do que anteriormente . Utilizá-la-á principalmente para fins práticos , mas ficará livre do diálogo interior involuntário e conhecerá a quietude , interior .
Quando usar a sua mente , e particularmente quando for necessária uma solução criativa , você oscilará frequentemente entre o pensamento e a quietude entre a mente e a ausência de mente . A ausência de mente é a consciência sem o pensamento . Só dessa maneira é possível pensar-se criativamente , porque só dessa maneira o pensamento terá verdadeiramente poder . O pensamento por si só , quando deixa de estar ligado ao reino muito mais vasto da consciência , torna-se rapidamente estéril , insensato e destrutivo .
A mente é essencialmente uma máquina de sobrevivência . Atacar e defender-se de outras mentes , reunir , armazenar e analisar informações - é nisso que ela é boa , mas não é de maneira nenhuma criativa . Todos os verdadeiros artistas , quer o saibam quer não , criam com base na ausência de mente , na quietude interior . Só posteriormente é que a mente dá forma ao impulso criativo ou à inspiração . Até os grandes cientistas dizem que os seus sucessos criativos aconteceram num momento de quietude mental . O resultado surpreendente de um inquérito , feito a nível nacional junto dos mais eminentes cientistas americanos , entre os quais Einstein , tendo em vista descobrir os respectivos métodos de trabalho , foi o de que o pensar " desempenha unicamente um papel secundário na fase breve , mas decisiva , do ato criativo em si " . 1 Por isso , eu diria que a simples razão pela qual a maioria dos cientistas não é criativa não é por não saber pensar , mas por não saber como parar de pensar !
Não foi através da mente , através do pensamento , que foi criado e é mantido o milagre que é a vida na Terra ou no seu corpo . Existe claramente uma inteligência a reger este processo que é de longe maior do que a mente . Como pode uma única célula humana , que de largura mede um milionésimo de polegada , conter dentro do seu DNA instruções que dariam para encher 1.000 livros de 600 páginas cada um ? Quanto mais aprendemos sobre o funcionamento do corpo , mais compreendemos quão vasta é a inteligência que o rege e quão limitado é o nosso conhecimento . Quando a mente se liga novamente a essa inteligência , transforma-se numa ferramenta maravilhosa .
Serve então algo maior do que ela .


EMOÇÃO : A REAÇÃO DO CORPO À SUA MENTE   

E quanto às emoções ? Eu sou mais influenciado pelas minhas emoções do que pela minha mente .
A mente , tal como eu a concebo , não consiste apenas no pensamento . Inclui as emoções assim como todos os padrões de reações mentais e emocionais inconscientes . A emoção nasce no local onde a mente e o corpo se encontram .
É a reação do corpo à mente - ou poderia dizer-se , um reflexo da mente no corpo . Por exemplo , um pensamento hostil criará no corpo uma acumulação de energia a que damos o nome de ira . O corpo prepara-se para lutar . A ideia de que está a ser atacado , física ou psicologicamente , leva o corpo a contrair-se , e é este o lado físico daquilo a que chamamos medo . Várias pesquisas demonstraram que as emoções fortes podem provocar alterações na estrutura bioquímica do corpo . Essas alterações bioquímicas representam o aspecto físico ou material da emoção . É evidente que , regra geral , você não tem consciência de todos os seus padrões de pensamentos e , muitas vezes , é apenas pela observação das suas emoções que pode tomar conhecimento deles .
Quanto mais você se identificar com o seu pensamento , com os seus gostos e aversões , críticas e interpretações , ou seja , quanto menos presente estiver como consciência observadora , mais forte será a carga da energia emocional , quer tenha consciência dela ou não . Se você não conseguir sentir as suas emoções , se estiver desligado delas , acabará por as experimentar a um nível puramente físico , na forma de um problema ou de um sintoma físico . Tem-se escrito muito sobre este assunto nos últimos anos , pelo que não há necessidade de o abordarmos agora . Um padrão emocional inconsciente forte pode mesmo manifestar-se como um acontecimento externo que parece só lhe acontecer a si . Por exemplo , tenho notado que as pessoas com muita raiva dentro de si , sem dela terem consciência e sem a manifestarem , são mais atreitas a serem atacadas verbal e até mesmo fisicamente , e muitas vezes sem razão aparente , por outras pessoas iradas . As primeiras emitem uma forte emanação de ira que determinadas pessoas captam subliminarmente e que provoca nestas últimas a explosão da sua própria ira latente .
Se você tiver dificuldade em sentir as suas emoções , comece por concentrar a sua atenção no campo de energia interior do corpo . Sinta o seu corpo a partir do interior . Isso colocá-lo-á também em contato com as suas emoções .
Analisaremos este assunto em pormenor mais adiante .
Diz que uma emoção é um reflexo da mente no corpo . Mas por vezes existe um conflito entre as duas : a mente diz " não " enquanto que a emoção diz " sim " , ou vice-versa .
Se quiser realmente conhecer a sua mente , o corpo dar-lhe-á sempre um reflexo fiel dela , portanto observe atentamente a emoção , ou antes , sinta-a no seu corpo . Se entre eles houver um conflito aparente , o pensamento será a mentira e a emoção será a verdade . Não a verdade última de quem você é , mas a verdade relativa do seu estado de espírito nesse momento .
Não há dúvida de que são vulgares os conflitos entre pensamentos superficiais e processos mentais inconscientes . Talvez você não consiga ainda reconhecer a atividade da sua mente como pensamentos , mas ela refletir-se-á sempre no seu corpo como uma emoção , e esta última você poderá reconhecer . Observar atentamente uma emoção desta maneira é basicamente o mesmo que ouvir ou observar um pensamento , como descrevi atrás . A única diferença é que , enquanto que o pensamento reside na sua cabeça , a emoção tem uma forte componente física e por isso é sentida principalmente no corpo . Poderá então permitir que a emoção se manifeste sem se deixar controlar por ela . Você deixará de ser a emoção ; passará a ser o observador , a presença observadora .
Se você fizer isto , toda a inconsciência que houver em si será trazida para a luz da consciência .
Portanto , observar as nossas emoções é tão importante como observar os nossos pensamentos ?
Sim . Habitue-se a perguntar a si próprio : que estará a acontecer dentro de mim neste momento ? Esta pergunta indica-lhe qual o caminho a seguir . Mas não analise , limite-se a observar atentamente . Concentre a sua atenção no seu íntimo . Sinta a energia da emoção . Se não houver emoção presente , leve a sua atenção ainda mais fundo para o campo de energia interior do seu corpo . É a entrada para o Ser .
Geralmente , uma emoção representa um padrão de pensamento amplificado ao qual foi incutida energia e , por causa da sua carga energética , muitas vezes irresistível , ao princípio não será fácil estar-se suficientemente presente para poder observá-la com atenção . Ela quer dominá-lo e geralmente consegue-o -a menos que você esteja verdadeiramente presente . Se for forçado a identificar-se inconscientemente com a emoção , por não estar suficiente presente , o que é normal , a emoção torna-se temporariamente o seu eu
Muitas vezes estabelece-se um círculo vicioso entre o pensamento e a emoção : alimentam-se mutuamente . O padrão de pensamento cria um reflexo ampliado de si próprio na forma de uma emoção , e a frequência vibratória da emoção continua a alimentar o padrão de pensamento original . Quando você se fixa mentalmente numa situação , num acontecimento ou numa pessoa que é a causa perceptível da emoção , o pensamento incute energia à emoção , que por sua vez incute energia ao padrão de pensamento , e assim por diante .
Basicamente , todas as emoções são variações de uma emoção primordial e indiferenciada , que tem a sua origem na perda do conhecimento daquilo que você é para além de um nome e de uma forma . Devido à sua natureza indiferenciada é difícil encontrar um nome que descreva essa emoção com exatidão . A palavra " medo " é bastante aproximada , mas para além de uma sensação contínua de ameaça , ela também inclui uma sensação profunda de abandono e de imperfeição . Talvez seja melhor usar um termo que seja tão indiferenciado quanto essa emoção básica e chamar-lhe simplesmente " dor " .
Uma das principais tarefas da mente é lutar contra essa dor emocional ou fazê-la desaparecer , essa é uma das razões para a sua atividade incessante , mas tudo o que consegue fazer é disfarçá-la temporariamente . De fato , quanto mais a mente luta para se ver livre da dor , maior é a dor . A mente nunca consegue encontrar a solução , nem se pode dar ao luxo de permitir que você descubra essa solução , porque ela própria é uma parte intrínseca do " problema " . Imagine um chefe de polícia a tentar encontrar um pirômano quando esse pirômano é o próprio chefe de polícia . Você não se libertará da dor a não ser que deixe de ir buscar à mente a sensação que tem de si próprio , ou seja , de ir buscar ao ego . A mente será então destituída da posição de poder que ocupa e o Ser revelar-se-á a si próprio como sendo a sua própria natureza .
Sim , eu sei o que me vai perguntar a seguir .
Ia perguntar-lhe : e no que toca às emoções positivas , como por exemplo o amor e a alegria ?
São inseparáveis do nosso estado natural de ligação íntima com o Ser . É possível obterem-se vislumbres de amor de alegria , ou de breves momentos de profunda paz , sempre que ocorre um hiato no caudal do pensamento . Para um grande número de pessoas , esse hiato ocorre raramente e apenas acidentalmente , quando a mente fica " sem fala " , o que por vezes é provocado por uma grande beleza , por um esforço físico extremo , ou até mesmo por um grande perigo . De repente , há uma quietude interior . E nessa quietude há uma alegria sutil mas intensa , há amor , há paz .
Geralmente , esses momentos são de curta duração , pois a mente rapidamente retoma a sua barulhenta atividade a que nós chamamos pensar .
Amor , alegria e paz não podem desenvolver-se a não ser que você se liberte do domínio da mente . Mas eu não lhes chamaria emoções . Estão para além das emoções , num nível muito mais profundo . Portanto , você precisa de estar plenamente consciente das suas emoções e ser capaz de as sentir antes de poder sentir o que se situa para além delas . Emoção significa literalmente " pertubação " . A palavra vem do latim emovere , que significa " deslocar " ou " perturbar " .
Amor , alegria e paz são estados profundos do Ser , ou melhor , três aspectos do estado de ligação interior com o Ser . Como tal , não possuem opostos , porque a sua origem está além da mente . Por outro lado , as emoções fazem parte da mente dualista , pelo que estão sujeitas à lei dos opostos . O que significa simplesmente que não pode haver o bem sem o mal . Por conseguinte , na nossa condição não iluminada , quando ainda nos identificamos com a mente , aquilo a que muitas vezes e erradamente se dá o nome de alegria é o lado do prazer , geralmente de curta duração , do ciclo permanente de dor e de prazer .
O prazer tem sempre origem em algo exterior a si , enquanto que a alegria nasce dentro de si . A mesma coisa que lhe dá prazer hoje provocar-lhe-á dor amanhã , ou então abandoná-lo-á , pelo que a sua ausência provocará dor . E aquilo a que muitas vezes chamamos amor poderá ser agradável e exitante durante algum tempo , mas é uma dependência viciante , uma condição extremamente precária que se pode transformar no seu contrário num abrir e fechar de olhos . Muitos relacionamentos de " amor " , passada a euforia inicial , oscilam na realidade entre " amor " e ódio , atração e ataque .
O amor verdadeiro não faz sofrer . Como poderia ? Não se transforma de repente em ódio , assim como a alegria verdadeira não se transforma em dor .
Como já referi , antes mesmo de você ser iluminado - antes de se ter libertado da sua mente - , poderá ter vislumbres da alegria verdadeira , do amor verdadeiro e de uma paz interior profunda , calma , mas vibrante e viva . Estes são aspectos da sua verdadeira natureza , a qual é geralmente encoberta pela mente . Mesmo num relacionamento dependente " normal " , poderá haver momentos em que sentirá a presença de alguma coisa mais genuína e mais incorruptível . Mas serão unicamente vislumbres , rapidamente encobertos de novo pela interferência da mente . Poder-lhe-á então parecer que você teve algo de muito valioso e o perdeu , ou então a sua mente poderá convencê-lo de que , de qualquer modo , tudo isso não passou de uma ilusão . A verdade é que não foi nenhuma ilusão , e você não o pode perder . Faz parte do seu estado natural , que poderá ser encoberto , mas nunca destruído pela mente . Tal com um céu carregado de nuvens , o Sol não desaparece . Continua lá , por trás das nuvens .
Diz Buda que a dor ou o sofrimento nasce do desejo ou ânsia de possuir e que para nos libertarmos da dor devemos quebrar as cadeias do desejo .
Todas as ânsias de possuir são manifestações da mente que procura a salvação ou a satisfação em coisas exteriores e no futuro como substitutos para a alegria do Ser . Enquanto eu for a minha mente , eu sou essas ânsias , essas necessidades , esse querer , esses apegos e essas aversões , e separado deles não há " eu " exceto como mera possibilidade , como um potencial não satisfeito , como uma semente ainda por germinar . Nesse estado , até o meu desejo de ser livre ou iluminado não passa de mais uma ânsia a ser realizada ou completada no futuro . Portanto , não procure ver-se livre do desejo nem procure " alcançar " a iluminação . Torne-se presente . Esteja presente como observador da mente . Em vez de citar Buda , seja " o desperto " , que é o que a palavra buda significa .
Os seres humanos vivem nas garras da dor há eternidades , desde que caíram do estado de graça entraram no reino do tempo e da mente e perderam o conhecimento do Ser . Nessa altura , começaram a ter a percepção de si próprios como fragmentos sem sentido num universo estranho , desligados da Fonte e uns dos outros .
A dor é inevitável enquanto você se identificar com a sua mente , ou seja , enquanto estiver inconsciente , espiritualmente falando . Refiro-me aqui basicamente à dor emocional , a qual é também causa principal das dores e das doenças físicas . Ressentimento , ódio , autocomiseração , remorso , ira , depressão , inveja e coisas semelhantes , e até mesmo a mais pequena irritação , são formas de dor . E todos os prazeres ou todos os pontos altos emocionais contêm de si a semente da dor : o seu oposto inseparável que se manifestará a seu tempo .
Qualquer pessoa que já se tenha drogado para ficar " bem " sabe que o bem acaba por se tornar mal , que o prazer se transforma numa certa forma de dor .
Muitas pessoas também sabem , por experiência própria , quão fácil e rapidamente uma relação íntima se pode transformar , de uma fonte de prazer , numa fonte de dor . Vistas de uma perspectiva mais ampla , ambas as polaridades , positiva e negativa , são faces da mesma moeda , fazem parte da dor subjacente que é inseparável do estado egoico de consciência identificada com a mente .
A sua dor tem dois níveis : a dor que você cria no presente e a dor que vem do passado e que ainda continua a viver na sua mente e no seu corpo . Deixar de criar dor no presente e desfazer a dor passada - é disso que eu lhe quero falar agora .
Texto : Eckhart Tolle ( extraído do livro O Poder do Agora cap. 1 )
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