domingo, 1 de maio de 2011

" A IOGA DA MENTE DISCERNENTE "

Meditação do sonho
Quando o estado desperto tende a desaparecer , produz-se uma transformação da consciência a qual se manifesta sob a forma panorâmica de sonho ou sombra , na inconsciência total . O homem adormece habitualmente enquanto sua mente se ocupa de idéias pouco vivazes ou imaginações ligeiras , que podem , umas e outras , continuar a existir pela simples atividade mecânica do cérebro . Mas , não estando este submetido a um controle enérgico , funciona incorretamente . A memória desta experiência deformada , acrescida à das experiências anteriores e às associações de idéias recentemente formadas no decurso do estado de vigília , constitui a base do sonho confuso médio . Mas aquilo de que o homem se lembra de maneira vivaz , é somente dos últimos anéis da cadeia . É porque eles ficam no centro da atenção concentrada enquanto que todos os outros elos se separaram desse centro .
O estado que se produz entre o sono e a vigília não só é muito interessante , porque não pertence nem a um nem a outro e constitui uma fronteira com os caracteres de cada um deles , mas também porque é muito receptivo à sugestão . Este ponto infinitesimal intermediário , na orla do sono , oferece uma ocasião única para a prática da concentração .
Já explicamos que a última tendência de pensamento retido na consciência quando adormecemos , é recolhida no lugar mais profundo da mente , que age então sobre si mesma em seu modo misterioso e eficaz . Este estranho poder mental pode ser utilizado para exercer um controle sobre a vida do sonho . A ocasião de desenvolvê-lo e libertá-lo das experiências desarrazoadas e até más , existe nesse momento que precede a volta noturna do sono , particularmente para aqueles que sonham mais ou menos habitualmente . Os que sonham raramente nada têm a deplorar ; é uma vantagem , porque o fim do sono mais elevado é obter justamente o repouso total , num estado desembaraçado de qualquer pensamento ou sonho .
O estudante se prepara , pois , para dormir e dirige seus pensamentos para o futuro , procurando , a proncípio , imprimir fortemente em sua consciência a sugestão de que seus próximos sonhos se racionalizem e depois imaginando-se a si mesmo nas experiências nitidamente definidas no curso destes sonhos . O estudante deve desejar fortemente introduzir neles uma ordem racional e uma unidade lógica . Deve aspirar a ficar suficientemente consciente no curso desses sonhos para bem compreender que sonha , mas não tanto , e conserva a consciência do mundo físico que acaba de abandonar . A mente deve entregar-se inteira à sugestão e banir qualquer outra idéia . O estudante terá êxito nisso se tomar nota dos sonhos mais vivazes e lúcidos que lhe deixaram uma impressão bem registrada .
Se desejar lembrar-se de mais de um sonho , é preciso tomar o maior cuidado de não levantar-se bruscamente . A passagem à atividade desperta deve fazer-se de maneira calma , a mais progressiva e espontânea possível . O estudante deve dirigir sua atenção ao interior imediatamente após o despertar , afastando com energia qualquer outro pensamento que venha turbar sua concentração sobre o instante final do sonho . O sucesso virá mais rapidamente se estiver profundamente convencido da verdade do mentalismo . Porque se puder conservar , no plano de fundo da mente , durante suas atividades despertas , a convicção de que todas as experiências são construídas por essa mente , tomará inevitavelmente a mesma atitude , cedo ou tarde , durante suas atividades de sonho . Quando esta convicção se tornar natural e habitual , estender-se-á mais facilmente a essas atividades . É igualmente útil para o estudante afastar-se , em qualquer momento do dia , de seu ponto de vista ordinário e tomar posição de uma testemunha desinteressada . Deve por-se a refletir que o que está fazendo será semelhante a um sonho , um ou dois momentos mais tarde , porque será então somente passado , do qual só o pensamento poderá doravante retirar . Deslocando-se de um lugar para outro , deve igualmente meditar que o lugar abandonado se tornou também um objeto da memória , que nunca foi senão uma forma-pensamento contida na consciência .
Durante muito tempo , não será bem sucedido em seu esforço , isto é , passará ao estado de sonho incontrolado ou de inconsciência total que caracteriza ordinareamente o sono do homem . É preciso , pois , repetir este exercício para que traga seus frutos . Um dia produzir-se-á o fato estranho que lhe ensinará haver aberto uma nova porta na vida noturna . Esta porta não se entreabrirá senão ligeiramente no começo , mas depois , com o tempo e perseverança , abrir-se-á mais e mais . O sono tornar-se-á desde então um estado paradoxal em que a vida do sonho não mais desapontará o estudante , porque não cessará de saber que assiste a um sonho efetivamente . Terá o sentimento estranho de estar acordado no meio do sonho que entretanto conservará as mesmas características . Um tal homem não sonha mais , no sentido ordinário da palavra , e não perde mais sua noite a erguer essas construções fantásticas e ociosas que enchem a maioria das imaginações noturnas . O sono se transforma numa vida coerente e lógica , em que todas as faculdades de vontade , de julgamento , de crítica , de memória etc . , funcionam tão eficazmente como no estado de vigília . Esta vida de sonho se torna um prolongamento natural da atividade do dia , conquanto se exerça em limites muito mais vastos . Este exercício deve ser uma tentativa para realizar seus mais elevados ideais . A conduta em sonho deve , pois , ser submetida a um autocontrole muito mais rigoroso e ser inspirada por uma moralidade bem superior à da vida corrente .
Perigos poderiam advir em caso contrário . É necessário ser vigilante .
No sonho , a mente cria uma causalidade , uma matéria , um espaço e um tempo novos . Se o estudante consegue estabelecer seu controle sobre esta faculdade , dispõe de um poder quase mágico para fazer nascer e conduzir os acontecimentos do sonho , à vontade . Poderá não somente visitar lugares afastados e entreter-se com pessoas longínquas , anulando assim a matéria , mas imaginar episódios e acontecimentos que se produzem logo que o desejar . O sentimento de possuir ao mesmo tempo uma liberdade total e a capacidade de modelar a existência é naturalmente exaltante . O estudante se lembrará , entretanto , de que se trata de uma aventura na fantasia , de uma viagem ao País das Maravilhas , que acabará na hora exata do despertar .
Essa experiência é suscetível de tomar um novo desenvolvimento com o tempo . O estudante pode constatar que se se põe a pensar em alguma coisa ou em alguém com uma atenção concentrada durante a experiência do sonho , um gênero de clarividência se manifesta . Um poder particular pode mesmo prender-se à sua existência noturna , visto que pode descobrir que certos acontecimentos , contatos e conversações do dia seguinte serão anunciados pelo sonho .
Qualquer pessoa que não atingiu este completo domínio , pode executar um exercício análogo se desejar ardentemente comunicar-se com o espírito de uma pessoa querida desaparecida . Basta-lhe concentrar-se no momento exato de adormecer tendo em sua mente a imagem mental dessa pessoa e formulando o desejo de obter um contato mental , no decorrer da noite que começa . Embora os planos espaço-tempo sejam tão diferentes que o véu da Natureza fica ordinariamente opaco , a concentração pode , entretanto , obter uma resposta . A mente do pensador reproduz este fato em benefício da consciência do sonho . É então possível que o espírito se manifeste desta maneira indireta , embora esta manifestação não possa exceder de alguns minutos e renovar-se frequentemente . Aconselhamos com cuidado não fazer essa prática , que não contribuiria para o desenvolvimento do estudante e poderia mesmo retardá-lo se recorresse amiúde ao esforço indicado . Falamos disso aqui somente no caso de o estudante não puder sobrepujar a saudade e o luto , e não querer recorrer a outros métodos . Mas se não há um pedido de comunicação , pode perfeitamente dirigir seu amor a esse espírito toda vez que o desejar , no fim de qualquer de suas meditações .
Estabelecer um controle sobre a vida do sonho pode , pois , conduzir a importantes resultados . O valor prático do sucesso está na transformação de sono em horas de consciência durante as quais um trabalho mental útil pode ser feito . O valor metafísico vem de que este êxito traz uma nítida confirmação da doutrina mental relativamente à natureza do mundo exterior e da pessoa que o experimenta . Seu valor místico consiste em poder dividir em dois a consciência , entre um observador imparcial , que se mantém imóvel , e a personalidade que faz a experiência das mudanças . Porque , com efeito , o fim da meditação principal não é viver num mundo de fantasia nem mesmo saber que se sonha , mas efetivamente , operar uma introversão que permite abandonar o ponto de vista pessoal .
Se os motivos são puros e os fins exaltados , o estudante experimentará , de espaço em espaço , durante sua vida desperta , estados análogos ao do devaneio sem tema . Seu rosto e o seu corpo aparecem então com intensidade ante os olhos do espírito . Parece que o olha do exterior . Se puder manter esta imagem bastante tempo , o estágio seguinte será alcançado depressa . Ele consiste numa sensação nítida de estar separado do corpo , de achar-se atrás e acima de si mesmo como um espírito desencarnado . Não empregamos aqui uma metáfora espacial , mas fazemos uma descrição literal . O estudante não deve espantar-se com essa experiência . É muito efêmera e não pode causar nenhum mal . Muito ao contrário , descobrirá , no momento certo , que uma outra presença nasceu no interior da sua órbita mental , uma presença calma e etérea . Deve procurar manter-se , por assim dizer , nessa atmosfera divina desde que a sente em torno de si .
O espantoso mecanismo da mente do sonho atingiu então a fruição das suas altas possibilidades . Não é , naturalmente , um resultado muito frequente . Tripura , um antigo manuscrito sânscrito , diz a este respeito : " A consciência ininterrupta , mesmo durante o sonho é a marca da classe mais elevada dos sábios " . Mas ninguém tem necessidade de ser um sábio para fazer experiência desta vida superior do sonho . Todo aquele que deu alguns passos na via ultramística , pode ( não necessariamente ) participar dela parcialmente , de vez em quando . É igualmente verdade para aqueles que , como Descartes , avançaram nesta via sem o saber , por concentrações de pensamentos sobre assuntos não materialistas . O cético pode proclamar todas estas experiências impossíveis . Elas o são , com efeito , para aqueles que não crêem nelas e identificam o espírito com o cérebro .
Pode declarar também que elas têm um caráter de alucinação , e que são o resultado manifesto da auto-sugestão ou de uma atividade natural da imaginação . Nós lhe responderemos : " Vós não estais muito longe da verdade . Se soubésseis qual o papel considerável que desempenham a sugestão e a imaginação na vossa vida desperta , não julgaríesis milagroso que elas intervenham na vossa vida de sono . Se soubésseis que quase todas as vossas experiências terrestres são , em certo sentido , alucinações , não negaríeis ao homem o poder de controlar essas alucinações particulares e fragmentárias que vós chamais de sonhos . Quando tiverdes compreendido o que a imaginação é , na realidade , tereis quebrado a casca que encerra o maior dos vossos tesouros e que é a Mente ; então , e somente então , podereis ter a ousadia de marcar limites às possibilidades maravilhosas do homem " .
Texto : Paul Brunton ( do livro A Sabedoria do Eu Superior Pag. 302 a 329 )
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