sexta-feira, 1 de maio de 2009

A Lagarta !

A lagarta , ou taturana , é bem o símbolo do homem profano .
A borboleta é comparável ao homem iniciado ( Convertido ) .
A lagarta rasteja pesadamente nas baixadas . O seu corpo desgracioso não é senão boca e estômago .
Para que a lagarta possa tornar-se borboleta , é indispensável que passe por uma espécie de morte , a crisálida , ou casulo . No fim do seu período de lagarta , deixa ela de comer , retira-se a um lugar solitário e lá se metamorfoseia . Não sabemos se ela sofre com esta metamorfose . E , se sofre , também aceitaria de boa vontade esse sofrimento , porque instintivamente , a lagarta sabe que o seu verdadeiro estado é o de borboleta alada . Neste último estado é o inseto completamente diferente da lagarta : com quatro asas velatíneas , meia dúzia de pernas elegantes e flexíveis , dois olhos de opala com milhares de facetas visuais ; dispõe de uma língua em forma de espiral contráctil , com a qual suga o néctar das flores . Em vez de rastejar pesadamente pela terra , a borboleta voa elegantemente pelos espaços ensolarados , donde só desce , de tempos a tempos , para se alimentar duma gotinha de néctar sugado do perfumoso cálice das flores .
Há um contraste frisante entre toda a vida da lagarta e a da borboleta .
E toda essa modificação se deu durante a morte da lagarta e o nascimento da borboleta , que é a crisálida , que pode ser comparada com a meditação profunda .
Durante a verdadeira e completa meditação , o homem fica como morto , imóvel , silencioso , totalmente ensimesmado na consciência espiritual , sem o funcionamento dos sentidos e da mente . A meditação foi comparada pelos mestres espirituais como o egocídio , ou morte voluntária e temporária do nosso ego físico-mental , mas plena vigília do Eu espiritual . Paulo de Tarso , referindo-se a este estado , escreve : " Eu morro todos os dias , e é por isso que eu vivo - mas já não sou eu quem vivo , o Cristo é que vive em mim " .
E o próprio Cristo diz : " Se o grão de trigo não cair em terra e morrer , ficará estéril ; mas se morrer , produzirá muito fruto " .
Um homem que nunca passou por este estado de morte voluntária , continua a ser um homem profano , materialista , interessado somente nas coisas do corpo físico e das emoções .
Não é o sofrimento como tal que transforma o homem , mas é o sofrimento compreendido e aproveitado . Mas o homem que nunca viveu no seu interior por uma profunda interiorização ou meditação , dificilmente pode sofrer com serenidade , não pode dizer " eu transbordo de júbilo no meio de todas as minhas tribulações " . O homem profano , sem sofrimento transformador , continua a vida inteira como lagarta pesada e comilona - ao passo que o homem que passou por um sofrimento compreendido , e aceito , entra numa atitude de serenidade e leveza , que faz lembrar o adejar silencioso da borboleta , que apesar disto , continua a manter o contato com a terra .
O sofrimento compreendido e aceito confere ao homem uma intuição estranha das coisas superiores ; dá-lhe gosto pelas coisas que , outrora , o desgostavam ; dá-lhe facilidade de compreender o incompreensível e de ver as coisas invisíveis .
Ninguém pode gostar do sofrimento por causa do sofrimento - que seria masoquismo mórbido - mas pode querer o sofrimento como um meio e um caminho que conduzem a uma vida superior - que os não-sofredores ignoram .
Essa inefável estesia e clarividência que o sofrimento compreendido produz vale por todas as dores e angústias anteriores . O lúgubre fantasma vestido de luto se transformou num querubim luminoso , com a luz da felicidade nos olhos e o sorriso da vida eterna nos lábios .
Quem quiser voar como borboleta , não tenha medo de morrer como crisálida depois de ter vivido como taturana .


Texto : Huberto Rohden .
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